Pela primeira vez, a AstraZeneca admitiu à Justiça britânica que seu imunizante contra o coronavírus “pode, em casos muito raros, causar síndrome de trombose com trombocitopenia”.

O parecer foi divulgado pelo jornal britânico The Telegraph, que teve acesso aos autos de uma ação coletiva de 51 famílias contra a farmacêutica. Elas pedem indenização de até £ 100 milhões (o equivalente a R$ 650 milhões) em decorrência do ‘efeito colateral raro’.

Em documentos anexados ao processo, a AstraZeneca afirma que a vacina pode causar a síndrome, conhecida como TTS. Nesse quadro, há a formação de coágulos de sangue, o que pode ocasionar o entupimento de veias e artérias.

A farmacêutica afirma, em uma carta enviada em maio de 2023 à defesa de um dos requerentes que “não aceita” que o imunizante cause TTS “ao nível genérico”, mas também admite que o imunizante pode, em “casos raros”, levar o imunizado a desenvolver a condição.

Ainda segundo a AstraZeneca, não se sabe qual o mecanismo que causa o efeito colateral. Ela adicionou, ainda, que “a TTS também pode ocorrer na ausência da vacina AZ [da AstraZeneca] (ou de qualquer vacina). A causalidade em qualquer caso individual será matéria para prova pericial”.

À imprensa, a farmacêutica afirma que a segurança dos pacientes é a sua maior prioridade. “As autoridades reguladoras têm normas claras e rigorosas para garantir a utilização segura de todos os medicamentos, incluindo vacinas”, disse.

“A partir do conjunto de evidências de ensaios clínicos e de dados do mundo real, a vacina AstraZeneca/Oxford tem demonstrado, continuamente, ter um perfil de segurança aceitável e os reguladores em todo o mundo afirmam de forma consistente que os benefícios da vacinação superam os riscos de potenciais efeitos secundários extremamente raros”, acrescentou.

O imunizante foi desenvolvido em parceria com a Universidade de Oxford e chegou a ser produzido no Brasil pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), mas o Ministério da Saúde interrompeu sua produção nacional em abril de 2023.

A pasta deixou de recomendar a aplicação de dois imunizantes de vetor viral contra a Covid-19 – AstraZeneca e Janssen – justamente pelo risco aumentado de trombose cerca de 30 dias após vacinação.

Segundo o Ministério, até setembro de 2022, 98 casos (0,02 casos por 100 mil doses aplicadas) com suspeita de Síndrome de Trombose com Trombocitopenia (queda de plaquetas) foram registrados no e-SUS com relação temporal com as vacinas. Dos 98 casos, 34 foram atribuídos às vacinas, 17 foram registrados como com relação provável e 47 foram considerados casos possíveis.

A correlação entre os imunizantes e o desenvolvimento de TTS não foi totalmente desvendada, mas ainda assim a pasta quis interromper o seu uso para evitar um possível risco adicional à saúde da população.

À BBC Brasil, o infectologista Evaldo Stanislau de Araújo, do Hospital das Clínicas de São Paulo, afirmou que existe a possibilidade de algumas pessoas terem uma probabilidade genética maior de desenvolverem o quadro.

“Existe uma possibilidade de algumas pessoas – e não temos como identificar isso individualmente – possuírem uma característica genética, muito pessoal, que em contato com essas vacinas de vetor viral, favorecer à hipercoagulabilidade, favorecendo a criação de trombos”, disse o infectologista.

Em nota divulgada no ano passado, a pasta reconheceu que a vacina da AstraZeneca “ foi extremamente importante para o controle dos casos e redução de óbitos por covid-19 no país e no mundo, salvando milhares de vidas. Desde dezembro de 2022, essa vacina é indicada para pessoas a partir de 40 anos, de acordo com as evidências científicas mais recentes”.

Além disso, informou que os casos “adversos são raros e ocorrem, em média, um a cada 100 mil doses aplicadas, apresentando risco significantemente inferior ao de complicações causadas pela infecção da covid-19”.

O Ministério da Saúde ressaltou “que todas as vacinas ofertadas à população são seguras, eficazes e aprovadas” pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e pela OMS (Organização Mundial da Saúde)”.

Apesar de ter tido sua produção interrompida no Brasil, o imunizante da AstraZeneca/Oxford continua entre as indicações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e ainda tem autorização para ser utilizada no país em caso de falta de outros imunizantes ou em casos de contraindicação.

No total, são dez vacinas autorizadas pela OMS:

Vacina Pfizer
Vacina Moderna
Vacina AstraZeneca
Vacina Janssen
Vacina Sinopharm
Vacina Sinovac (CoronaVac)
Vacina Bharat
Vacina Novavax
Vacina Cansino
Vacina Valneva

No Brasil, o Ministério da Saúde oferece, por meio do Programa Nacional de Imunização (PNI), quatro imunizantes: CoronaVac (Sinovac), Pfizer, AstraZeneca e Janssen – as duas últimas são ofertadas apenas em casos em que há contraindicações de outros imunizantes.

A pasta informa, no site do governo, que as vacinas aplicadas no Brasil são “eficazes, efetivas e seguras”, autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e analisadas “por um rígido processo de avaliação de qualidade pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), da Fundação Oswaldo Cruz”.

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