Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), há cerca de 70 milhões de pessoas no mundo com Transtorno do Espectro Autista (TEA), também conhecido como autismo, sendo em torno de 2 milhões somente no Brasil.

Embora o TEA seja frequentemente diagnosticado na infância, há ainda muitos adultos que não foram diagnosticados e que convivem e/ou sofrem com os sintomas do autismo, sem sequer imaginar que possam ter o transtorno. Isso resulta na falta de apoio e tratamento necessários para essas pessoas.

Causas do Transtorno do Espectro Autista

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um distúrbio neurológico que afeta o desenvolvimento cerebral e atinge indivíduos no nascimento ou nos primeiros anos de vida. As causas exatas do autismo ainda não são totalmente compreendidas, mas há uma grande variedade de fatores de risco inespecíficos. Os principais são: idade parental avançada, baixo peso ao nascer ou exposição fetal a ácido valproico (uso durante a gestação).

“Estimativas de herdabilidade para o transtorno do espectro autista variam de 37% até mais de 90%. Atualmente, até 15% dos casos de transtorno do espectro autista parecem estar associados a uma mutação genética conhecida. No entanto, mesmo quando um transtorno do espectro autista está associado a uma mutação genética conhecida, não parece haver uma determinação completa. O risco para o restante dos casos parece ser multifatorial, possivelmente com centenas de marcadores genéticos fazendo contribuições relativamente pequenas”, afirma Thiago Robles Juhas, neuropsicólogo da Clínica Araújo & Fazzito.

Sintomas do autismo em adultos

O Transtorno do Espectro Autista é uma condição que afeta a interação social, a comunicação e o comportamento. Embora os sintomas possam variar amplamente entre os indivíduos, alguns sinais comuns observados em adultos são:

Dificuldade na interação social: Dificuldade em manter conversas, interpretar pistas sociais, fazer contato visual adequado, compreender emoções e expressões faciais, ou estabelecer relacionamentos próximos.

Comunicação atípica: Dificuldade em iniciar e manter conversas, interpretar linguagem corporal e linguagem não verbal, compreender sarcasmo, ironia ou linguagem figurativa, ou adotar um tom de voz monótono.

Interesses restritos ou fixação: Interesses incomuns e intensos por tópicos específicos, como colecionar objetos incomuns, foco em detalhes minuciosos, ou aderência rígida a rotinas ou rituais específicos.

Sensibilidades sensoriais: Sensibilidade a estímulos sensoriais, como ruídos altos, luzes brilhantes, texturas de alimentos ou toques leves, podendo resultar em reações intensas ou evitamento.

Dificuldades na mudança de rotina: Resistência a mudanças, necessidade de seguir rotinas predefinidas e dificuldade em se adaptar a situações imprevistas.

Hipersensibilidade ou hipossensibilidade emocional: Pode haver dificuldade em expressar ou reconhecer emoções em si ou nos outros, ou reações emocionais incomuns.
Habilidades motoras diferentes: Pode haver dificuldades com habilidades motoras finas ou grossas, como coordenação motora, equilíbrio ou movimentos estereotipados.
Níveis do autismo
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Segundo o DSM-5-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), utilizado por profissionais para o diagnóstico e a classificação de transtornos mentais, o TEA pode ser classificado de acordo com os níveis de gravidade ou necessidade de suporte para as atividades da vida diária:

Nível 1 (leve): é o grau mais leve do autismo, conhecido como autismo de alto funcionamento. A maioria dos pacientes nível 1 vive e trabalha de forma independente;
Nível 2 (moderado): a maioria dos pacientes precisa de alguma assistência, mas pode ter algum grau de independência;
Nível 3 (severo): a maioria dos pacientes precisa de apoio significativo nas tarefas do dia a dia, incluindo atividades como ir ao banheiro, vestir-se, alimentar-se, fazer sua higiene pessoal etc.
Além de informar sobre a necessidade de suporte do paciente, os níveis auxiliam na elaboração do plano de tratamento.

Variações nos níveis do espectro
Uma pequena proporção de indivíduos apresenta deterioração comportamental na adolescência, enquanto a maioria dos outros melhora. O transtorno do espectro autista não é um transtorno degenerativo, sendo comum que aprendizagem e compensação continuem ao longo da vida. Os sintomas são frequentemente mais acentuados na primeira infância e nos primeiros anos da vida escolar, com ganhos no desenvolvimento frequentes no fim da infância.

“Algumas intervenções especializadas podem auxiliar o paciente com TEA a tornar-se menos dependente, desenvolvendo habilidades e tornando-se mais autônomo. Nesse sentido, é possível um paciente migrar de nível 2 (moderado) para nível 1 (leve), por exemplo. Contudo, é importante salientar que a classificação leve indica o nível de autonomia e independência do paciente. Portanto, TEA nível 1 não quer dizer que a pessoa não precise de auxílio de profissionais de saúde”, afirma Adriana Hess, neuropsicóloga do Hospital Moinhos de Vento e pós-doutora em Psicologia.

Diagnosticar o autismo na vida adulta pode ser um desafio para a medicina, pois esse grupo tende a apresentar comprometimentos menos evidentes. Ainda, os sinais e os sintomas podem ser mascarados por outras comorbidades psiquiátricas, como transtorno de ansiedade social, transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno esquizoafetivo.

Muitas dessas pessoas que aparecem pela primeira vez para o diagnóstico na idade adulta são levadas pelo diagnóstico de autismo em alguma criança da família ou pelo rompimento de relações profissionais ou familiares. “Nesses casos, pode ser difícil obter uma história detalhada do desenvolvimento, sendo importante levar em conta as dificuldades autorrelatadas”, diz o neuropsicólogo Thiago Jules.

Quando a observação clínica sugerir que os critérios são preenchidos no presente, pode ser diagnosticado o transtorno do espectro autista, desde que não haja evidências de boas habilidades sociais e de comunicação na infância.

Impactos do diagnóstico tardio

Patrícia Ferreira, neuropsicóloga do Hospital Moinhos de Vento e mestre em Psicologia, conta que o TEA é uma condição da vida toda, ou seja, pacientes diagnosticados na vida adulta foram crianças com TEA não diagnosticado. De uma forma ou outra, estes pacientes encontraram recursos para lidar, ou mascarar, os sintomas.

“Ter acesso ao diagnóstico auxilia na compreensão de situações e até mesmo de desconfortos que estes pacientes enfrentaram até o diagnóstico, que, mesmo tardio, trará mais qualidade de vida ao paciente”, afirma a profissional.

O diagnóstico na infância possibilita uma gama de intervenções que auxilia o paciente, especialmente se ele for um paciente nível 2 ou 3. Durante a vida adulta, diversos desses pacientes com grau leve aprenderam estratégias compensatórias para lidar com os sintomas, ou mesmo aprenderam a mascarar os sintomas para se adequar às expectativas sociais. São adultos que tiveram os sintomas de TEA confundidos com outros diagnósticos, ou mesmo com timidez.

Contudo, isso não significa dizer que tais pacientes não encontraram dificuldades. Cabe ressaltar que os pacientes adultos, quando buscam diagnóstico, estão com sofrimento devido às suas dificuldades. Portanto, frequentemente, têm associados sintomas de depressão e ansiedade, que podem dificultar o diagnóstico.

Formas de tratamento para o autismo
As formas de tratamento para pacientes com TEA diagnosticados na vida adulta irão depender dos sintomas que trazem prejuízo. Geralmente, pacientes que recebem o diagnóstico apresentam dificuldades de interação social (iniciar e manter relacionamentos interpessoais , compreender as demandas do trabalho etc.) ou ainda podem estar com depressão.

“Esses pacientes precisam de atendimento psicológico. As terapias indicadas para TEA são Terapia Comportamental e Terapia Comportamental Dialética. [É necessário] atendimento psiquiátrico para administração de psicofármacos para diminuir sintomas psiquiátricos associados. Também é possível indicar atendimento de terapia ocupacional para casos de alterações sensoriais”, diz Renata Kochhann, neuropsicóloga do Hospital Moinhos de Vento e pós-doutora em Psicologia.

Para adultos com casos leves a moderados, o recomendado é acompanhamento médico, com psicoterapia e estimulação de habilidades sociais . Já nos casos mais graves, assim como nos casos de crianças autistas, é recomendado que o adulto tenha acesso às demais formas de terapia citadas, pois apresenta comprometimentos significativos.

Como auxiliar pessoas autistas no dia a dia?
O primeiro passo é compreender os sintomas de TEA para reduzir o estigma e o preconceito. Nesse sentido, disseminar informações sobre o transtorno via cursos, mídias sociais e palestras é fundamental. Esse movimento ajuda que pacientes autistas (ao longo da vida) consigam ser mais entendidos dentro da sociedade.

Isso porque, embora os tratamentos para TEA sejam eficazes, eles não trazem cura e, ao longo da vida, sempre serão enfrentadas dificuldades. As leis existentes também auxiliam os pacientes, pois possibilitam a adaptação curricular (escola e faculdade), empregos com carga horária reduzida e tempo menor de espera em filas (mercado, banco, aeroporto).

IG