Como cantava Dorival Caymmi: “Dia dois de fevereiro. Dia de festa no mar. Eu quero ser o primeiro para saudar Iemanjá”. Embora a divindade seja cultuada em diferentes épocas do ano pelo Brasil, é nesta data que Iemanjá recebe as reverências mais famosas, principalmente na Bahia, com a tradicional festa que é realizada no Rio Vermelho, em Salvador. Na ocasião, os devotos se dirigem as águas para entregar suas oferendas à Rainha do Mar.

Iemanjá, divindade africana das religiões do Candomblé e de Umbanda, é considerada a mãe das águas e de quase todos os Orixás. Segundo os historiadores, a tradição de entregar presentes para ela começou em 1923 quando um grupo de pescadores decidiu consultar os búzios para entender a falta de peixes e foram orientados a pedir ajuda a Iemanjá e a presenteá-la. A tradição foi crescendo e, na década de 1950, foi oficializada como a “Festa de Iemanjá”.

iBahia conversou com os Babalorixás Pai Ducho de Ogum, do Terreiro Ilê Axé Awa Ngy, e com Idelson Salles, do Ilê Axé Ogunjá, para entender melhor como funciona a escolha dos presentes e a celebração, que este ano será diferente em virtude da pandemia do novo coronavírus.

Na Festa de Iemanjá, do Rio Vermelho, todo ano um terreiro de candomblé fica à frente das obrigações religiosas. O Babalorixá Pai Ducho de Ogum foi eleito pelos pescadores da colônia do Rio Vermelho como o responsável pelo presente de 2021. “Vamos fazer um balaio muito odara, muito bonito, com uma Iemanjá dentro, com todas as coisas que pertencem a ela, que vamos levar no dia 2, às 8h da manhã, para a embarcação e ‘arriar’ no mar”, explica Pai Ducho, sobre a entrega deste ano.

É importante salientar que o dia de reverência Iemanjá é relativo e cada terreiro tem seu calendário específico de homenagens. Como a celebração se tornou tradição no dia 2 de fevereiro, na capital baiana, acabou sendo um dia especial também para os terreiros. Além disso, a entrega de presentes pode ser feita em outras localidades para além da praia do Rio Vermelho – a preferência é que seja em local de água.

Babalorixá Idelson em cortejo | foto: arquivo pessoal

Para homenagear Iemanjá, que é a deusa da beleza e do amor, o Babalorixá Idelson Salles, do Ilê Axé Ogunjá, de São Félix – Cachoeira, explica que pode colocar flores, sabonete, talco, pentes, joias, perfumes (como alfazema), bonecas e a comida da orixá . Os presentes fazem referência ao feminino, a vaidade.

“Evite colocar coisas escuras e comida que não seja a dela. Outra coisa evita entregar seu presente ingerindo bebida alcoólica”, aconselha o Babalorixá Idelson, que também contou que este ano em São Félix a celebração vai ser mais reservada, sem cortejos e envolvendo menos pessoas na entrega do balaio nas águas, por causa da pandemia.

A preparação dos balaios, a arrumação da embarcação, a entrega e o pós-entrega do presente são cercados por rezas e cânticos nos terreiros.

Os dois Babalorixás reforçam que para a entrega do presente, independente do local escolhido, é importante que ir de coração limpo, com boa vontade, confiança e acima de tudo com fé. Com relação ao ser aceito ou não, Idelson Salles afirma que “a gente sente algo, uma energia na hora colocamos o presente”. Ele também esclareceu que os devotos podem vestir branco, azul e verde. 


Presente para Iemanjá | Paula Fróes/GOVBA

Importância da celebração 

Em 2020, a prefeitura da capital baiana concedeu o título Patrimônio Cultural de Salvador à Festa de Iemanjá, que acontece no dia 2 de fevereiro, no Rio Vermelho. No ato solene, ACM Neto, que era o prefeito, reforçou que é um sinal de respeito à importância histórica da celebração.

“A gente só constrói uma sociedade forte preservando a nossa história e projetando o futuro através da nossa sociedade”, disse ACM Neto, que também pontuou que Salvador é a capital da diversidade e que a gestão municipal precisa saber estimular e respeitar o convívio com as diferenças, inclusive religiosas.