Quinze dias após serem humilhados na estação Maracanã, no Rio de Janeiro, os jovens obrigados por policiais e agentes do trem carioca a fazer sexo oral ainda tentam retomar minimamente a rotina. Na segunda-feira (22), a Defensoria Pública fluminense fechou acordo para que a administradora do transporte, SuperVia, indenize as vítimas – os valores não foram divulgados.

“A vida do meu filho mudou bastante depois do que aconteceu. Ele era de festa e agora não sai de casa. Chora, e anda muito nervoso. Acha que algumas pessoas olham de um jeito estranho para ele na rua. Quando está mais tranquilo, eu também estou. Mas, quando está mal, é assim que eu fico”, contou a mãe de uma das vítimas à defensoria.

Para a outra mãe, os dias serão de luta pelo bem-estar e pela saúde do filho. “Ele evitar sair à rua e, quando vê um carro de polícia, acha que vai acontecer de novo. Espero, sinceramente, que isso não aconteça com mais ninguém”, disse.

Os dois funcionários da concessionária foram demitidos. “As medidas reforçam o posicionamento da SuperVia de não tolerar, em hipótese alguma, práticas como essa no sistema administrado pela concessionária, nem em seu quadro de colaboradores”, afirmou, por nota (leia na íntegra abaixo).

Já os dois militares estão detidos na Unidade Prisional da Polícia Militar fluminense, em Niterói, na região metropolitana do Rio.

Indenização

O acordo prevê o pagamento de curso profissionalizante às vítimas e a participação da defensoria nos treinamentos realizados pela concessionária com os funcionários.

Assinado também pelos jovens e pelas famílias, o documento prevê a escolha do curso profissionalizante pelas duas vítimas, de 17 e 18 anos, com a exigência de frequência mínima. Em relação à reparação por danos morais, os valores estão protegidos por cláusula de sigilo.

“Além da reparação pelos danos sofridos, a nossa maior preocupação era a de garantir o tratamento psicológico tanto para os jovens quanto para os familiares. O estado psicológico deles é muito ruim não só pelo o que aconteceu, mas também em razão da repercussão dos vídeos. As vítimas são humilhadas e ofendidas diariamente”, afirma a coordenadora Cível da DPRJ, Cíntia Guedes.

“Outra preocupação foi a de viabilizar uma formação profissionalizante para que os jovens tenham melhores condições de seguir suas vidas”, observa a defensora.

Além da Coordenação Cível da Defensoria, participaram das negociações com a Supervia a Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da DPRJ (Cdedica) e o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh). O defensor-geral do Estado, Rodrigo Baptista Pacheco, conduziu a primeira das três reuniões realizadas com a Supervia.

“Os agentes que atuam nas plataformas e na segurança das estações recebem treinamento periódico da Supervia e, em razão do caso em questão, a Defensoria vai auxiliar nessa capacitação. O objetivo é instruir os agentes quanto às formas de abordagem e os direitos dos usuários do serviço”, ressalta a subcoordenadora da Cdedica, Beatriz Cunha.

Estupro no trem

No último dia 7, dois jovens, de 17 e 18 anos, foram obrigados a fazer sexo oral após abordagem que contou com agentes do trem e policiais militares. Eles foram detidos sem nada de ilícito na estação Maracanã e acabaram humilhados pelas autoridades.

“Mais que humilhação, covardia. Levou a gente para trás da estação. Começou a bater na gente. Jogou spray de pimenta, bateu com a arma na nossa cara, chutou a cabeça. Mandou a gente rolar no mijo, secar o mijo”, relatou um dos jovens, à época, ao G1.

O estupro foi filmado pelos agressores e divulgado na internet. “Eles obrigaram. Colocaram a arma na nossa cabeça. Se a gente não fizesse, iam matar a gente”, explicou.

Nota da SuperVia na íntegra:

“A SuperVia decidiu demitir os dois funcionários do setor de segurança da concessionária por envolvimento no caso de abuso a dois jovens na estação Maracanã, na tarde do último domingo (07/07). A decisão foi tomada após o trabalho da comissão de sindicância interna instaurada ainda nessa terça-feira (09/07) para apurar o caso com o rigor necessário. Após a finalização dos trabalhos, a concessionária vai registrar o caso em delegacia e apresentar à polícia as conclusões da sindicância interna. A empresa se mantém à disposição das autoridades para auxiliar nas investigações e atuará como assistente de acusação neste processo.

Tais providências evidenciam o repúdio da concessionária aos atos cometidos por estes funcionários e por outros possíveis envolvidos, de acordo com o relato das vítimas. As medidas reforçam o posicionamento da SuperVia de não tolerar, em hipótese alguma, práticas como essa no sistema administrado pela concessionária, nem em seu quadro de colaboradores.

A concessionária se solidariza com as vítimas e com seus familiares e reforça o compromisso de oferecer a melhor capacitação aos seus funcionários para que atuem com a ética e o decoro, que são premissas da SuperVia. Vale reforçar que todos os funcionários do setor de segurança da empresa são intensamente treinados para agir com idoneidade e respeito em qualquer uma das situações vivenciadas no sistema. A capacitação inclui temas como “Controle Emocional e Administração de Conflitos”, e “Código de Ética, Conduta e Postura”, dentre outros”.