A atriz e produtora cultural Paloma Alecrim, de 26 anos, recebeu um diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) após sentir cansaço excessivo. A doença neurodegenerativa rara progrediu a ponto de causar paralisia e prejudicar a fala. De Araçuaí (MG), ela vivia em São Paulo onde trabalhava como atriz, mas teve de voltar à cidade natal com o diagnóstico e a expectativa de apenas 2 a 4 anos de vida. A VivaBem, Paloma conta sua história.

“A doença chegou do nada. Comecei a sentir cansaço excessivo e fraqueza muscular em abril de 2022, mas associei meus sintomas às sequelas da covid que tive um ano antes.

Os sintomas se agravaram bastante ao longo dos meses e eu caía ao andar na rua ou subir na bicicleta, escorregava dentro de casa, não tinha força para cortar alimentos, tinha dificuldade para manusear talheres, não conseguia pentear o cabelo.

Também sofria com espasmos musculares, movimentos involuntários e a voz ficava rouca com frequência. Coisas simples do dia a dia eram grandes desafios e quem me conhece sabe que não sou assim. Meu corpo estava me avisando de que não estava bem.

Sou estudante de teatro e, em setembro de 2022, tivemos uma aula de canto. Começamos a nos apresentar e, quando chegou minha vez, minha voz não saía. Comecei a ficar emocionada porque não conseguia falar, mas não era timidez. Fui acolhida pela professora e pelos amigos, mas fui para casa pensativa.

Naquela época, entrei em cartaz com meu monólogo Olhos D’água. Já estava com a doença, mas não sabia e, mesmo com dificuldade, eu estreei. Foi bem difícil, mas consegui.

Fui ao neurologista mesmo sem conseguir ter feito os exames solicitados: uma ressonância magnética e um eletroneuromiografia dos 4 membros. Na consulta de retorno, o lado esquerdo do meu corpo já estava bem comprometido, com atrofia na mão.

Em certa ocasião, filmei um dos espasmos musculares que tive à noite. Minha perna ficou por mais de um minuto tremendo sem que eu conseguisse ter controle. Apesar de ser um caso grave e de urgência, tive de esperar ter vaga via SUS e aquela angústia foi tomando conta de mim.

Em novembro, liguei para uma amiga médica e mandei a gravação dos espasmos. Ela me encaminhou para o Hospital das Clínicas em São Paulo, pois se tratava de uma emergência.

Fiquei internada por cinco dias e fui submetida a vários exames e só então recebi o diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). O diagnóstico é demorado por ser uma doença extremamente rara e a confirmação, realizada apenas por exclusão (é preciso excluir outras doenças para confirmar a ELA).

Recebi a notícia sozinha porque não quis preocupar minha família que estava longe [Paloma estava em São Paulo e a família, em Minas Gerais]. O médico me levou a uma sala com mais cinco médicos, me deu o diagnóstico e me explicou que eu teria mais 2 a 4 anos de vida. Eles ficaram assustados porque é uma doença rara e, na minha idade, ainda mais rara.

Voltei a Minas, em novembro, para morar com minha avó, que considero como mãe, mas não tive condições financeiras para fazer mudanças no espaço. Venho me adequando com o que tenho no momento. Gosto da vida, nunca fui de ficar reclamando sentada sobre algo. Sou do tipo que pega e faz.

‘Apesar dessa doença, tento trazer leveza e alegria para a minha vida. Faço piadas dos desafios que enfrento e vejo que, assim, deixo o ambiente mais leve para a minha mãe [a avó materna], que cuida de mim com muito amor.

A força dela é minha força, minha inspiração. Salete Alecrim é minha família, meu chão, minha religião, minha fé. Aproveito o ensejo para agradecer. Valorizo cada dia, cada abraço e momento. E aproveito ao máximo o afeto ofertado.

Tenho uma rede bonita de amigos, gosto de dançar, andar de bike, viajar e tomar banho de mar, cachoeira e rio. ‘ELA’ quer calar minha voz, meu grito, minha canção, meus sentimentos, meu tesão, questionamentos e reflexão. Só não disseram a ‘ELA’, desavisada, que eu tenho ELA, mas ela não me tem.”

Entenda a doença

O médico Thiago Taya, neurologista e neuroimunologista do Hospital Brasília (Rede Dasa) e professor de neurologia da Universidade Católica de Brasília, explica que a ELA é uma doença rara, principalmente em pessoas tão jovens.

Afeta, em média, de 2 a 5 pessoas a cada 100 mil habitantes, dependendo do país.
Acomete, principalmente, pessoas acima de 45 a 50 anos e é mais comum em homens.
Pode ocorrer em pessoas mais jovens, mas é muito incomum.

Ainda há poucas certezas sobre a causa da doença, mas há um fator genético (o que não significa que seja hereditátria): ocorre por um mecanismo específico do DNA que gera a tendência a desenvolver a ELA.

Na prática, ocorre o desgaste e morte de neurônios acometidos, que deixam de mandar mensagens aos músculos.
Possui evolução rápida: a sobrevida é de 2 a 4 anos.

Sintomas

Fraqueza muscular progressiva, que piora dia após dia, semana após semana, mês após mês. Atenção: um cansaço comum, após um dia de trabalho e que passa depois do descanso, não é sintoma da doença.

Pode começar em uma perna e um braço e depois vai avançado para os outros membros. Pode chegar ao rosto (o paciente não consegue mexer a boca, a pálpebra, a testa).

O único movimento que a ELA costuma poupar é o movimento dos olhos — olhar para os lados, para cima ou para baixo
Thiago Taya, neurologista

Sensação de tremor no músculo, que é quando o músculo fica tremendo e mexendo sozinho. Pode acontecer em várias regiões do corpo.
Músculo enrijecido e contraído, o que impede a movimentação do membro.

A doença não acomete a parte cognitiva do paciente, ou seja, memória, raciocínio lógico, capacidade de resolução de problemas e orientação ficam completamente preservados, o que gera um sofrimento para o paciente porque ele perde os movimentos, mas tem sua consciência intacta
Thiago Taya, neurologista

Tratamento

Não há cura. O paciente deve passar por fisioterapia e fonoaudiologia, para tentar manter preservado o máximo possível de força muscular e de força da garganta.
Também é importante auxílio psicológico.
Não há como prevenir o desenvolvimento da ELA. O diagnóstico rápido é a melhor forma de evitar a progressão acelerada da doença.

Uol